sexta-feira, 15 de março de 2013

O QUE NOS ALIMENTA?


  •   O que nos alimenta?
  • É muito bom conhecer outra cultura, outra história, é realmente arrebatador/deslumbrante no princípio. Mas esta sensação não é perene. É um deslumbre passageiro. Alimenta-nos provisoriamente. A normalidade do mundo, a realidade concreta das coisas e a rotina aos poucos colocam novamente nosso olhar em repouso, na fria racionalidade. Além disso, a realidade não é para o olho – o mais iludível dos sentidos (não me lembro qual teórico de peso escreveu isto). 
  • O ser humano é o que há de mais incrível na face da Terra. Sem dúvida. Os animais também o são. E para ambos somente a constância cria vínculos. Somente a constância cria laços e os encontros. Não é preciso se esforçar para criá-los, embora possamos favorecê-los. Vem naturalmente.  
  • A dança favorece o encontro. A arte o favorece. O trabalho em grupo o favorece. O vinho o favorece, embora de modo pouco natural. Daí as danceterias. E os bares. E as casas noturnas. Favorecem o encontro. O encontro humano é a grande alegria, é o grande prazer. Um local histórico sem pessoas vivas, sem histórias atuais, é morto como um deserto. Compreender e ser compreendido, encontrar-se com outra história, com outro viés, enfim, amar e ser amado, dar e receber, trocar, certamente é o alimento de mais alta nutrição para o ser humano.
  • Mas, o que busca a grande massa? Busca esse enriquecimento com alimentos de baixa nutrição cultural, de baixa humanidade. Seriam eles os objetos belos para os olhos – uma porção de objetos rodeando esse ser; e esses objetos devem ser trocados, pois o olhar logo deles se enfastia; então há a troca de linha: uma série de objetos desgastados pelo olhar. Há também os objetos para o toque, os tecidos. Para o olfato, os aromas, os perfumes. Esses objetos alimentam superficialmente o homem. Alimentam bem pouquinho. Então os humanoides vão ficando áridos, secos de nutrição, secos de humanidade. Fechou-se a barreira para o outro ser humano, é por isso. É fato ser uma alimentação antinatural – não está o planeta afetado por este abuso? O que o humano precisa é de outro humano para se humanizar.
  • Nessa humanização ocorre algo misterioso, uma troca e uma anulação do ego. O eu, o ego, o papel social, parece ausentar-se neste momento. Quando esse estado se refina, a troca se coloca em papel secundário e o sentimento de doação toma o papel do ego. Nesse momento, a alimentação do outro é o grande objetivo e o ego se dilui, transfigurando-se e mergulhando na felicidade do outro. Ao mergulhar aí diluímos o nosso ego e tornamo-nos mais humanos, mais universais. Trata-se de um cardápio refinado, de altíssima nutrição. Não conheço alegria mais genuína que essa. Não conheço alimentação de maior nutrição para o ser e para a alma.