quinta-feira, 4 de novembro de 2010

MEMORIAL RODRIGO DA ROSA

MEMORIAL RODRIGO DA ROSA


É contado que seus antepassados, os da família Franz, chegaram ao Brasil no final do século XIX. Vindos da Alemanha, aportaram no Rio Grande do Sul, tempo em que esta cidade falava mais o Espanhol, o castelhano, do que o Português. É sabido que preferiam as serras ao mar, e as terras serranas (frias) às quentes. Rancho Queimado é a cidade da serra catarinense na qual se instalaram os familiares diretos (bisavós) de Rodrigo da Rosa. Passei por lá em 2009. Que lindas terras! Que cuidado com tudo! Campinas verdejantes bem alinhadas e cuidadas; casas rigorosamente assuntadas.

É de saber honroso que me contam que Emilio Hartivig Franz, notadamente meu avô materno, aprendera alemão escrito antes do Português em colônia de Santa Catarina. É sabido também que fora proibido de falar o idioma germânico assim que Getúlio Vargas posicionou-se frente à 2ª Guerra Mundial. Os causos dizem que aprendeu um pouco de português escrito com minha avó. Contara-me ela, de nome Edith Maria Borges dos Santos Franz, a mulher mais espetacular que conheci, que o irmão de Hartivig, o seu cunhado, fora preso naquele então de pós guerra. Tomara umas cachaças e desatara-se a cantar na língua de Goeth; diz-se que soldados, ou militares, meteram-lhe o cacete e encarceraram-no por algum tempo. Foi assim que a família Franz participou de modo subversivo da história do país.

Da família Borges guardo alguma semelhança como Jorge Luis Borges; embora essa correlação seja improvável agrada-me a sonoridade dos nomes.

Da família da Rosa, tenho que dizer que proveio da Ilha dos Açores, nos mesmos meados do fim do século XIX. Chegaram a Porto Alegre e aí instalaram-se demoradamente. A linhagem de fato se dispersou, percorrendo os interiores do estado, Santa Catarina e Paraná. Soube de alguns que se instalaram no interior de São Paulo e no Rio de Janeiro. Não soube de outros que não nós em São Paulo capital.

Lá pelos interiores de Santa Catarina miscigenou-se com alguma ou algumas famílias de indígenas, daí o cabelo negro e liso e a coloração levemente morena da pele de alguns. Os portugueses, como se sabe, não têm uma estirpe predominante. Desde as navegações misturaram-se com o mundo todo. Por fim não existe pureza alguma de raça. O próprio conceito de raça é cientificamente incorreto. Existe apenas a espécie humana.

É certo que os da Rosa instalaram-se numa região de tropeiros, fazendo comércio ou vivendo às matas, com alguma cultura. Meu falecido pai, que Deus o tenha, costumava falar do italianos, seus vizinhos, na região da baixa serra catarinense. Gostava deles: via em sua testa franzida e em seus olhos a cena: cabelos castanhos escuros, mesa de madeira cumprida e larga; gentaiada toda ali, na ordem, seriedade e ciso; tudo na hora de deveras; no prumo, às ordem do chefe da família; todos corretos comendo polenta e as macarronada da mama.

Parece-me que meu avô passou por dificuldade econômicas na região em que sentou praça, no Sapato, SC. E foi lá onde meu pai conhecera minha mãe.



Meu pai fora uma pessoa verdadeiramente correta. Ainda o é. Ensinou-me a aproveitar o tempo. Ensinou-me o amor ao trabalho. Ensinou-me cousas, como sorrir feito menino e gargalhar sonoramente.

Minha vida foi um comércio, uma mercearia, um bar – era aí onde vivia, de lá via o povo, me relacionava com as pessoas. Tinha um caderninho de contas, onde constava Nega Viva, José de Souza (O Zé pretinho), Seu Antártica, Jorge Bahia, Amâncio... Nomes que não sumirão de minha memória, por ser de personagens que nunca mais encontrarei.

Hoje, pensando... d”o bar” (como chamávamos) veio quase tudo: a sociedade, as pessoas, os papéis, as classes, tudo que conheci fora de mim era d”o bar”. Depois nem era mais bar, mas pegou de se falar “o bar”. Ali aprendi, graças ao meu pai, a estar sempre atento a tudo, a ser atencioso com os fregueses, a procurar melhorar e ajeitar sempre o ambiente ao meu redor. Meu ego não gostava disso naquele tempo, mas como o ego é infantil, hoje reconheço: o que se decantou daquela experiência é muito valioso.

Era no bar onde divulgávamos as revistas Seicho-No-Ie. Meus pais haviam sido Dendoin (Divulgadores) e havia uma quantidade imensa de revistas para divulgação. Acontece que um dia papai ficou sentido porque se sentiu menosprezado por um superior seu, dentro da Organização. Dali, então, deixou de trabalhar para o Movimento. Minha fizera reuniões em casa, as chamadas reuniões de vizinhança – isso quando eu era bastante criança. Depois, como “o bar” consumia muito tempo, deixou de realizá-las, juntamente com a decepção de meu pai.

Eu também já me decepcionei com pessoas. Elas parecem tão boas e tão amigas, mas acontece de um dia falhar. Certamente, também sou assim. O profº Taniguchi escreveu: “Por que esse mundo é desigual? Porque nossa mente o é, porque há desigualdade em nossa mente.” Essas palavras me impressionaram muito. Elas encerram a lei de causa e efeito. É preciso ter docilidade, ou seja, renúncia ao seu eu, ao seu ego, para aceitar a justiça perfeita de Deus. Acreditar de coração que a justiça de Deus é perfeita é aceitar que só tenho o que mereço. Se me decepcionaram e me sinto sentido por isso é porque já decepcionei alguém e o deixei sentido. É muito difícil aceitar isso, mas creio que seja a verdade. Estou me esforçando para aceitar essa verdade de coração.

Pois bem, quando meus pais se afastaram do movimento, nós, seus filhos, perdemos muito com isso. Perdemos as reuniões de criança, os Seminários e a maravilhosa Ibiúna. Deus do céu, gostaria que o mundo todo fosse à Academia de Ibiúna! Como esse mundo será mais belo quando todos reconhecerem que o amor e a alegria verdadeiros estão bem perto de nós! Estive em Ibiúna com cinco anos e retornei lá aos 15 anos. Quando eu tinha 13 anos, minha mãe comprou um convite para mim e meu irmão irmos à Convenção Juvenil, na Sede Central. Meu ego era tão grande, com apenas 13 anos, que não fiz um mínimo esforço para ir. Uma leve sensação de mal estar, sentida na porta do evento, me fez desistir de entrar e voltamos para casa. Quanto tempo eu perdi! Quem sabe se tivesse entrado naquela portaria teria mudado um pouco meu destino! Oh, adolescência e juventude! Por que não obedecem aos mais velhos?! São tão cabeça-dura!

Estimados amigos, não abandonem o Movimento de Paz pela Fé! Vocês se decepcionarão sim, com as pessoas, isso será inevitável! O Movimento fenomênico é imperfeito, as pessoas são imperfeitas, de fato! Mas fora do Movimento, o que você irá encontrar? Permaneça no Movimento, mesmo que se sinta cansado, mesmo que lhe pareça repetitivo e sem eficácia; mesmo que você não consiga resolver seus problemas pessoais – com o tempo tudo vai melhorando e evoluindo. Nós não conseguimos medir o quanto somos beneficiados por trabalhar para a Seicho-No-Ie, o quanto ela é importante para nossos filhos, para as gerações que virão.

O mundo é justo. Mas não delicado e antisséptico. O corpo pede atividade. Vida antinatural é vida sedentária e antisséptica. Os próprios remédios/ vacinas antialérgicos contém poeira e germes em sua fórmula. Não é melhor enfrentar a vida e criar anticorpos naturalmente?

A vida é justa, mas não é de cristal. Se você não estiver atento e se esforçar, a vida te obrigará a isso através da dor. Quem se acomoda ante as facilidades, quem gosta de sombra e água fresca está criando perturbações ou doenças terríveis que o obrigarão a se mexer e a mudar. Quem odiou com toda a força, desrespeitando as leis da mente, sofrerá muito com a dor física e mental. Assim é a justiça.

Pois bem, era um menino de muito ego, muito exigente, falante e espalhafatoso. Gostava da rua, e até demais, pois meu pai me tirou de lá com uma surra bem dada, e merecida, aos meus 13. Certa vez, agradecendo a papai na Seicho-no-ie, chorei e lembrei-me de agradecer-lhe com emoção àquele chacoalhão. Chegando à adolescência, calei-me. De tão racional, calculista e egoico, acho que resolvi calar-me para não errar, para que não percebem minhas falhas. Que desperdício de vida! De extrovertido por natureza, tornei-me introspectivo. Só ultimamente tenho redescoberto minha extroversão natural por meio do Clown.

Aos 13 ingressei no grupo de Teatro Nossa Terra, de minha cidade. Ali cresci muito, embora me adulterasse também. Aprendi o gosto pelos textos, pela arte. Ali fui reconhecido e tive o grupo sonhado da adolescência. Na escola, eu era um ET, de apelido “Esquisitão”. No grupo de teatro, todos me reconheciam. Aos 15 fui à Academia de Ibiúna por primeira vez e participei de um grupo de Teatro na regional São Paulo Pinheiros, com a memorável Eliane Pacheco. Eu gostava dos amigos da Seicho-No-Ie, mas também gostava dos amigos do teatro. Como se dentro de mim tivesse a Natureza divina puxando para um lado e os desejos materiais puxando-me para outro. Assim, meu envolvimento com o Movimento da Seicho-No-Ie foi intermitente. Em 2000 fui vice-presidente da AL Campo Limpo. Em 2009, fui vice-presidente novamente. E em 2010 sigo como presidente da Associação Local dos jovens.

Antes disso, tenho que dizer que na infância e na adolescência tive doenças, todas advindas do medo de adoecer, outras por mágoa. Elas me aproximaram de Deus e dali comecei a ler avidamente os livros da Seicho-No-Ie e do Espiritismo. Tornei-me um grande conhecedor no início da adolescência e teve um momento na escola em que era chamado de “o conselheiro”.

Não posso omitir que com 16 comecei a cantar no Coral das Artes de Embu. Cantei por sete anos ininterruptos. Com ele, além de aprender muito sobre música, arte e convivência em grupo, pude viajar muito pelo Brasil e pelo mundo, como Argentina, Portugal e Itália. Devo muita gratidão a todos, especialmente ao maestro Daniel Vieira.

Em 2002, graças às práticas da Seicho-No-Ie, convicção, fé, ingressei na famigerada Universidade de São Paulo, no curso de Letras. Quando tive contato com autores como Marx, Nitzchie, Deleuze, Foucault e outros, abandonei a Seicho-No-Ie. Foi um período doloroso, pois foi como se perdesse a minha narrativa principal. Os problemas insolúveis vieram e tive de retornar à casa do Pai. Por fim, hoje vejo que foi bom passar por essa fase, pois os ensinamentos da Seicho-No-Ie saem vitoriosos mesmo tendo seus princípios contestados por grandes pensadores canonizados. O teísmo sai vitorioso para aqueles que têm sensibilidade, mais do que intelectualidade. Quando ainda estava na Universidade quis demonstrar isso a meus colegas: montei grupo de meditação e distribuí um texto no qual relatava meu despertar. Não posso dizer que foi aquele sucesso...

PROFISSÃO: PROFESSOR

Intuía que amaria ser professor, amaria ensinar. Na prática inicial fracassei – era demasiado complexo ser mestre. Então detestei sê-lo debrucei-me nos livros para ser um pesquisador e posteriormente lecionar em Universidade. Depois de dois anos preparando projeto, assistindo matéria como aluno especial, descobri que não era meu caminho. Eu teria de enfrentar a escola, os alunos difíceis, a periferia, a ignorância, a carência, a indisciplina ou a nova classe média, ignorante e esnobe – eu pensava naquele tempo.

Deus do Céu, como sofri em meus primeiros anos como professor! Lecionei para todas as séries, desde maternal até Ensino Médio, sendo professor particular de Espanhol também para adultos. Lecionei em escolas públicas, privadas de todo tipo, empresas, escritórios, casas... Com contrato, CLT, sem contrato, contrato verbal, estagiário, concursado...as oportunidades vinham, era como se eu tivesse de passar por todas as experiências docentes possíveis. Eu as enfrentei, sem desistir.

PROFESSOR: MISSÃO SAGRADA

Em 2008 encontrei-me sem saída e retornei à Seicho-No-Ie com toda a força. Um mundo construído por minha própria força era instável e imprevisível – mas um mundo segundo a vontade Deus era o único que poderia me proporcionar paz. Foi espantoso o despertar alcançado: era como se renascesse de novo, e era isso que todos diziam. Somente a partir desse momento, desse despertar, comecei a ver meus alunos de outra maneira e o professor começou a surgir dentro de mim. Em 2009 fui ao Seminário para educadores, em Ibiúna. Maravilhoso! 2009 parecia ser o ano de minha grande guinada.

Entendi profundamente que os alunos são a projeção da mente do professor e que cada professor tem os alunos que “merece”. Ou seja, cada professor encontra alunos semelhantes às suas vibrações mentais. “Aquele que purificou a mente ingressa em um mundo... elevado, adequado a ele. Aquele que não purificou a mente, cria com sua força mental um ambiente adequado a ele e padece neste ambiente”. O princípio é o mesmo para este mundo. Alunos difíceis servem para que purifiquemos nossa mente. Mas, é melhor pelo amor do que pela dor, não é? Quero dizer que se manifestarmos amor, nos purificaremos, e não encontraremos alunos tão difíceis.

Eu estava decidido a não trabalhar mais com adolescentes, pois tivera experiência deveras dolorosa em 2007. Contudo, com meu renascimento, decidi que enfrentaria o que Deus me desse.

No segundo semestre de 2008 tudo começou a mudar. O concurso no qual havia passado, para professor de EF II, e que havia desistido porque não queria enfrentar este ciclo, chamou-me para assumir novamente. Assumi. Fui lecionar numa periferia bastante difícil. Noites sem dormir, conflitos na sala de aula, problemas de indisciplina e desarmonia total. Eu poderia ter desistido, eu até pensei nisso. Mas intensifiquei minhas orações e fortaleci a fé: se os alunos são espelho da minha mente, quando harmonizá-la, os alunos também se harmonizarão. Foi o que aconteceu, como milagre! Após maratonas de orações para cada aluno, no oratório de minha casa, presenciei a grande mudança: alunos interessados, dóceis, atenciosos, e a aula fluindo de vento em popa. Voltando para casa chorei de emoção, agradeci muito a Deus e decidi ser um educador do amor.

No ano de 2010 iniciei os estudos do CEEV. Eu, que um professor inexpressivo, desrespeitado e muitas vezes ignorado pelos alunos, passei a ser amado por todos. Os outros professores e a direção passaram a me admirar. Eu mantive a humildade, sempre agradecendo, abençoando a tudo e a todos e orando pela felicidade dos demais.

Esta é a minha pequena biografia como educador. Daqui para diante certamente construirei tesouros ainda mais valiosos.

Um comentário:

  1. Nossa Rô, que maratona maravilhosa. Não tenho vocação com as letras, mas vou tentar escrever um esboço do meu caminhar....rs

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